17.4.10

16 de abril de 2010.



Esta noite vislumbrei detalhes de algo que, muito possivelmente, jamais se concretizará. E meus detalhes tinham sabores. Alguns sabores doces, outros um pouco aspéros. Mas, sempre, absolutamente intensos. Um devaneio destes gostosos, devaneios alados, brilhantes.

Mas eu acabei por me assustar um pouco ao notar que meu vislumbre ficou apenas por estes detalhes...em meus devaneios não consegui imaginar nenhuma conversa que tornasse aquela situação mais significativa. Não. Nada além daquela intensa sinestesia.

Abro parênteses para pontuar que eu realmente não sei se isso poderia ser diverso, uma vez que quem criou todo o quadro foi a minha mente, ora tão tortuosa. Fecho parênteses.

Os detalhes ficaram ali, guardados naquele tempo e espaço criados pela minha mente. Mas o silêncio assustou um pouco...assustou pela incapacidade de se fazer palavra (mesmo que fosse parte da minha criação). Assustou por ser um toque tão marcante nesta pequena grande existência. Assustou porque devaneios deveriam ser perfeitos, e não quebrados. Assustou porque pareceu que carregou em si a verossimilhança com a vida minha. Mas aqui peço permissão para afirmar que estou aprendendo, dia após dia, a encarar de forma mais absoluta os papéis que entendo pertinentes (e que fique claro: não os que me são delegados). Encaro, sobretudo, o papel de mulher não óbvia que sou.

Mudando do devaneio para o onírico, essa noite sonhei que estava em outra casa. Era uma casa com retoques do apartamento da rua com nome de poeta e advogado em que cresci. Mas eu transitava em um espaço imaginário que ligava as janelas dos quartos..um espaço do lado de fora do prédio. Um espaço que me permitia ver todo o fora mas também poder entrar nos quartos - se assim eu decidisse. No espaço que criei na noite anterior eu antevi o grito pela mãe, uma necessidade de segurar no parapeito, um pouco de pânico ao vislumbrar a liberdade de pender o corpo..no meu sonho eu retornei de uma janela para outra, entrando em uma outra parte do meu quarto (parte que no sonho eu sequer lembrava que existia e que não tem qualquer referência com o quarto real). Quando entrei nesta parte do quarto percebi que ela estava com a porta trancada. E eu decidi então destrancar a porta -- que era de vidro. Não me lembro a razão que me levou a estipular que, a partir de então, a tal porta ficaria aberta, mas me lembro bem porque eu mantinha ela fechada. Nada mais do que porque se alguém entrasse por ela poderia chegar ao outro lado do quarto, onde eu ficava, sem passar pela porta principal. E eu poderia não me dar conta de que alguém adentrava por aquela porta. Eu não me lembro ao certo o que aconteceu depois. Mas entendo que cabe a mim decidir o que acontece quando o vidro é aberto e expõe aquele local que sequer eu lembrava eu que existia.

Antes de pedir com licença deixo a Clarice Lispector trasbordar por mim:

"Ouve-me, ouve o meu silêncio. O que falo nunca é o que falo e sim outra coisa. Capta essa outra coisa de que na verdade falo porque eu mesma não posso."

0 comentários: